Negócios
Quer dar um up na sua carreira? Encontre um mentor


Encontrar mentores pode ser um passo decisivo para subir na carreira, mas é importante ter clareza de seus objetivos
Ter alguém experiente para guiar, aconselhar e compartilhar experiências pode ser um divisor de águas para quem quer subir na carreira ou se tornar um líder melhor. A orientação de um mentor não apenas acelera o crescimento profissional, mas pode oferecer uma perspectiva sobre os desafios e nuances do mundo corporativo. “É comum as pessoas associarem a mentoria a práticas semelhantes, como terapia ou coaching”, explica a professora da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas Maria José Tonelli.
Quando falamos sobre desenvolvimento pessoal e profissional, é importante entender as diferenças entre as abordagens disponíveis. “Enquanto no coaching o foco é estabelecer um objetivo relacionado ao desenvolvimento de carreira do indivíduo, a terapia visa um objetivo mais abrangente de autoconhecimento”, diz Tonelli.
A mentoria se concentra na solução de problemas específicos, oferecendo a oportunidade de analisar questões enfrentadas pelo profissional. “Além de compartilhar seus próprios aprendizados, acertos e erros, o mentor é aquele que sabe fazer perguntas para te ajudar a encontrar respostas que sozinho você não teria encontrado”, diz Heloisa Carvalho, cofundadora e CEO da MentorFlix, plataforma de mentoria para desenvolvimento de soft skills.
De maneira prática, se um profissional precisa de orientação e conselhos para lidar com desafios específicos no trabalho, a mentoria pode oferecer um direcionamento mais alinhado com esses objetivos. Essa decisão dependerá de diversos fatores e está diretamente relacionada às necessidades individuais de desenvolvimento de liderança de cada pessoa. “Se busca orientação e experiência de vida, um mentor pode ser mais adequado. Para objetivos específicos e desenvolvimento de habilidades, um coach pode ser a melhor escolha”, explica a especialista em liderança e ex-diretora executiva da CVC Corp, Daniela Bertoldo.
Como funciona a mentoria?
Dependendo do seu momento de carreira ou dos objetivos almejados, há diversas possibilidades e tipos de mentoria, cada um com um propósito distinto. Na mentoria tradicional, uma pessoa com mais experiência ajuda alguém menos experiente na mesma empresa ou área. Também é possível buscar um profissional fora da sua organização, com o objetivo de trazer um olhar externo e mais “imparcial”.
Existem outros tipos de mentoria, como a em grupo, em que um mentor orienta várias pessoas ao mesmo tempo, facilitando o aprendizado em conjunto, e a mentoria reversa, quando uma pessoa menos experiente ensina algo a um profissional com mais tempo de carreira, mudando os papéis usuais.
A mentoria pode ser tanto gratuita quanto paga. Dentro de uma empresa, um funcionário mais experiente pode orientar um colega gratuitamente para ajudá-lo a desenvolver suas habilidades. Também pode ser alguém da sua rede, que você admira e em quem confia e que já tenha passado por situações muito semelhantes às que você está vivendo. “Uma sugestão para quem está buscando um mentor fora do ambiente organizacional ou rede pessoal é participar de eventos, conferências, workshops e grupos de networking relacionados à sua área de atuação”, sugere Carvalho, da MentorFlix.
Mas se você está buscando a orientação de um especialista externo, como uma consultoria, é necessário pagar por esses serviços, que será mais especializado e focado no desenvolvimento efetivo. Além disso, há mentores profissionais que dedicam algumas horas de trabalho gratuitamente para aqueles que não podem arcar com custos. Iniciativas como a Alumna, Mentorela e Mentorflix são exemplos de empresas que conectam profissionais experientes com iniciantes no mundo corporativo.
Tonelli, no entanto, destaca a necessidade de evitar a banalização da mentoria no mercado. Para ela, a primeira condição essencial é a confiabilidade do mentor. Nesse sentido, é importante escolher mentores que possuam uma trajetória consolidada e relevantes experiências profissionais para garantir uma orientação sólida. “É comum ter pessoas sem experiência em gestão que se autointitulam mentores. Desculpe, mas é fundamental ter uma história para contar.”
Mas o mentor não é alguém que vai te entregar todas as respostas. “É um profissional que vai contribuir com repertório, vivência, experiência, e, principalmente, entender o lugar que você está e te oferecer ferramentas para melhorar”, diz Heloisa Carvalho, da MentorFlix.
Importância da mentoria para as mulheres
A experiência de contar com um mentor ou mentora é especialmente valiosa para as mulheres. “A mentoria amplia a visibilidade e as oportunidades em setores predominantemente masculinos, ao mesmo tempo em que facilita o desenvolvimento de confiança e habilidades de liderança.”
Ela também ressalta o potencial transformador da mentoria na vida das mulheres líderes. “É preciso reconhecer o impacto transformador que podem ter um no outro e no mundo, ao compartilhar conhecimentos, experiências e apoio.”
Universo executivo
Aqueles que alcançam posições de liderança enfrentam frequentemente a solidão inerente a esse papel, uma vez que ocupam posições de destaque, resultando em uma situação mais isolada.
Ao lidar com esse cenário, surge a necessidade de compartilhar genuinamente angústias, questões e dificuldades. Nesse cenário, a troca de experiências e desafios é uma lacuna para o líder, tornando a mentoria para aqueles ocupando posições de liderança muito relevante. “A mentoria precisa ser um lugar de confiança e abertura. E é importante que haja humildade para reconhecer que você pode ser melhor”, diz Carvalho, CEO da MentorFlix.
Para Marcelo da Rocha, por exemplo, a mentoria veio em um momento crucial, quando o cirurgião-dentista buscava validar os caminhos que estava seguindo e compreender melhor os processos de gestão e aprimorar suas habilidades administrativas. “Para quem é da área da saúde, a gestão não faz parte do nosso dia a dia”, diz.
Apesar de já ter experiência em gestão, quando foi convidado para liderar o projeto LAI, um ecossistema odontológico, ele sentiu a necessidade de entender mais sobre todos os processos que envolvem a gestão.
Para Rocha, a oportunidade de discutir problemas reais e explorar diferentes perspectivas com pessoas experientes tanto na academia quanto no mercado proporcionou a ele uma evolução significativa como gestor. “Eu sentia falta de dividir com pessoas mais experientes, todos os meus pensamentos, a forma que eu conseguia, ou que eu pretendia levar o negócio”.
Segundo a professora Maria José Tonelli, a ideia ao trabalhar com o alto escalão é oferecer uma abordagem multidisciplinar ao colaborar com especialistas em gestão de pessoas, inovação e finanças. Nessas interações, eles buscam compreender os desafios atuais em diversos setores.
O objetivo fundamental da mentoria é fortalecer a tomada de decisão do gestor. “Como ele pode se fortalecer? Tendo embasamento e trocando com pessoas em quem confia”, destaca Tonelli, que também é mentora na CEOLab, empresa especializada em mentoria para executivos.
Negócios
Falta de Apoio das Empresas Afasta Mulheres da Liderança

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.
Mulheres dizem estar menos interessadas em avançar na carreira, segundo um novo relatório da Lean In e da consultoria global McKinsey, enquanto algumas organizações reduzem seus esforços para apoiar o desenvolvimento profissional feminino.
O relatório Women In The Workplace 2025 reuniu respostas de mais de 9.500 profissionais, de 124 empresas. As participantes foram questionadas sobre o desejo de serem promovidas ao próximo nível, e os resultados revelam uma mudança de comportamento.
As mulheres agora têm menos probabilidade do que os homens de demonstrar interesse em promoção, especialmente nos cargos de entrada: 80% dos homens disseram querer avançar na carreira, contra apenas 69% das mulheres. “Estamos em uma encruzilhada”, afirma Sheryl Sandberg, ex-COO do Facebook e cofundadora da Lean In, organização que atua para acabar com a desigualdade de gênero no mercado de trabalho.
Embora a pesquisa faça perguntas sobre ambição há mais de uma década, os resultados deste ano mostram o maior gap entre gêneros já registrado — e é a primeira vez que o resultado é estatisticamente significativo. “Isso não se aplica a todas as mulheres em todas as empresas”, explica Sandberg. “A queda na ambição está concentrada entre mulheres que sentem que seus ambientes de trabalho já não investem em seu crescimento.”
Empresas reduzem programas com foco na liderança feminina
A pesquisa mostra que muitas organizações reduziram programas voltados a apoiar mulheres a avançar na carreira. Em uma parte do relatório, profissionais de recursos humanos foram questionados sobre as políticas de suas empresas. Muitas organizações deixaram de priorizar iniciativas como treinamentos contra vieses de gênero e esforços para fortalecer a diversidade. Quase uma em cada seis afirmou ter reduzido equipes ou recursos dedicados à diversidade e inclusão. Ainda assim, a maioria das organizações entrevistadas afirma continuar comprometida com essas iniciativas.
Rachel Thomas, CEO e cofundadora da Lean In, afirma que, se as mulheres sentem falta de apoio e percebem “ventos contrários” nos níveis mais altos, podem se tornar menos ambiciosas. De fato, os pesquisadores descobriram que mulheres que contam com o apoio de mentores e líderes seniores demonstram o mesmo interesse por promoções que seus colegas homens. “Quando as mulheres recebem as mesmas tarefas desafiadoras, oportunidades de treinamento em liderança e acesso a gestores, essa lacuna de ambição simplesmente não existe”, acrescenta Sandberg.
A pesquisa mostrou claramente que os homens recebem mais desses recursos. Homens em cargos de entrada têm maior probabilidade do que mulheres de contar com um mentor ou defensor da sua carreira (45% contra 31%), receber tarefas desafiadoras (32% contra 22%) e ser indicados para promoção (28% contra 22%).
Talvez o dado mais impressionante seja que homens em cargos iniciais têm o dobro de chances de ocupar posições de gestão de pessoas em comparação com suas colegas mulheres. “Isso significa que eles têm mais chances de desenvolver as habilidades e a exposição que levam ao avanço na carreira”, explica Thomas.
Tendências culturais também podem influenciar
Essa mudança na ambição feminina não ocorre isoladamente. Além de as empresas estarem recuando em iniciativas que ajudam mulheres a progredir em suas carreiras, tendências culturais também as puxam na direção oposta. Alguns argumentam que tendências virais como “lazy-girl job” ou “snail-girl” — funções com menos estresse e mais flexibilidade — indicam que mulheres jovens estão abandonando a cultura da hiperprodutividade. Ao mesmo tempo, as redes sociais difundem conteúdos sobre “tradwives” (esposas tradicionais), que celebram ficar em casa e adotar papéis de gênero convencionais. Até mesmo o conceito de “stay-at-home girlfriends” — mulheres jovens que não têm empregos formais e se dedicam à casa, ao autocuidado e à rotina doméstica, sustentadas financeiramente por um parceiro — passou a fazer parte do debate.
Para além do direito individual de escolher como conduzir a própria vida e a carreira, Sandberg avalia que essas tendências refletem ideias antigas que seguem sendo prejudiciais às mulheres e à sua independência. “Existem mulheres que têm a possibilidade financeira e desejam ser esposas e mães em tempo integral. Essa é uma ótima escolha e pode ser uma vida muito plena e importante”, diz. “Mas a maioria das mulheres não tem essa opção. Financeiramente, a maioria precisa sair de casa para trabalhar e sustentar suas famílias.”
O que as empresas podem fazer para reduzir as desigualdades de gênero
Existem várias medidas que as empresas podem adotar para reverter a queda na ambição feminina e apoiar as carreiras das mulheres. Segundo Thomas, uma das ações mais essenciais é monitorar resultados: quem recebe apoio, quem tem acesso a treinamentos de liderança e quem é promovido. Acompanhar o acesso às oportunidades e garantir equidade é fundamental para criar um ambiente de trabalho em que as mulheres possam prosperar.
O relatório também recomenda que as empresas garantam que decisões de contratação e promoção sejam baseadas em mérito e que capacitem gestores para impulsionar o desenvolvimento de carreira de seus times. “Quando os gestores apoiam o avanço profissional, as mulheres têm uma probabilidade significativamente maior de receber aumentos ou promoções em comparação com aquelas cujos gestores não oferecem esse apoio”, afirma o relatório.
O estudo aponta ainda que, de modo geral, as mulheres se sentem menos confortáveis do que os homens para se posicionar e assumir riscos no trabalho. Thomas destaca que mentoria e apoio é uma das formas mais eficazes de ajudar profissionais a avançar na carreira. No entanto, isso costuma ser prejudicado pela tendência de gestores apoiarem pessoas semelhantes a eles próprios — ou seja, homens tendem a patrocinar outros homens. Para combater isso, ela defende que as organizações incentivem explicitamente líderes seniores a olhar além de seus círculos habituais e impulsionar profissionais com diferentes origens.
“Entendam que o campo de jogo não é nivelado para as mulheres, e o sistema não é justo para elas. E entendam que, para extrair o melhor desempenho de cada funcionário, é preciso garantir que o sistema funcione para todos”, afirma Sandberg. Ela diz estar “preocupada” com o futuro. Os resultados deste ano refletem um retrocesso para as mulheres, já que os avanços conquistados ao longo da última década estagnaram ou foram revertidos. Empresas e lideranças precisam agir para mudar essa trajetória.
*Kim Elsesser é colaboradora sênior da Forbes USA. Ela é especialista em vieses inconscientes de gênero e professora de gênero na UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles).
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Rubens Menin: “Negócio Bom Tem Propósito, Escala e Futuro”

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.
Rubens Menin Teixeira de Souza se diverte ao contar como tudo começou. “Lembro da satisfação que dava ver aquelas casinhas”, diz o fundador e hoje presidente do conselho da MRV&CO. A primeira delas, erguida em 1977 na Vila Clóris, em Belo Horizonte – cidade natal desse mineiro apaixonado –, foi o embrião do que viria a ser uma das maiores construtoras da América Latina.
Recém-formado em engenharia civil pela UFMG, uniu-se aos primos Mário Menin e Homero Paiva, da Vega Engenharia, para criar a MRV, apostando em habitação popular – à época, o “patinho feio” do setor. “Era pouco valorizado e não despertava interesse das grandes construtoras. Justamente por isso me chamou a atenção”, relembra o empresário de 69 anos.
Dos pais engenheiros, Menin herdou o interesse pelas obras; dos avós imigrantes, a ética do trabalho incansável. Em quase 50 anos de empreendedorismo, ampliou e diversificou seus negócios. Além de liderar a holding listada na B3, que também reúne uma subsidiária nos Estados Unidos, Resia, a loteadora Urba e a startup Luggo, ele é fundador e presidente do conselho do Banco Inter; da Log, de galpões logísticos; e da CNN Brasil, além de proprietário da Rádio Itatiaia. “Negócio bom para mim é aquele que tem propósito, escala e futuro.”
Casado há 47 anos com Beatriz, Menin tem três filhos (Rafael, co-CEO da MRV; João Vítor, CEO do Inter; e Maria Fernanda, presidente do Instituto MRV&CO) e nove netos – todos atleticanos, claro. A sucessão está concluída, mas Menin não para de construir: seu negócio agora é investir em algumas outras de suas várias paixões.
Na Menin Wine Company, sua produtora de vinhos e azeites na região do Douro, em Portugal, ele aportou 65 milhões de euros. A vinícola produz 600 mil garrafas por ano, mas Menin ainda não está satisfeito; quer chegar a 1 milhão. “Pode ser o melhor vinho do mundo. Por que não?” O que mais lhe tira o sono é o Atlético Mineiro (especialmente na época desta entrevista, quando o Atlético se preparava para enfrentar o Lanus na final da Copa Sul-Americana). É seu time do coração desde a infância, mas com o tempo se transformou em time também do estômago, do fígado… e especialmente do cérebro. Em 2023, conduziu a transição do clube para SAF (Sociedade Anônima do Futebol). Desde então, sócio majoritário e presidente do conselho do Galo, já investiu mais de R$ 600 milhões. “A Lei da SAF trouxe inovação. O futebol brasileiro é muito melhor do que era algum tempo atrás, e ainda muito longe do que tem que ser”, afirma.
É este espírito que o qualifica a estampar uma capa da Forbes Brasil em uma edição dedicada à inovação: de inquietação permanente, de constante busca de melhorias, de senso aguçado para aproveitar oportunidades, e principalmente de manter-se em movimento mesmo depois de, segundo as mais diversas métricas e parâmetros, já ter atingido tanto sucesso. Com quase sete décadas de vida, Menin esbanja energia, criatividade e sonhos. Nesse sentido, continua a ser um… Menino. Para quem inovar não é necessariamente embarcar em grandes transformações tecnológicas: “É fazer melhor hoje do que você fazia ontem”.
A seguir, acompanhamos o empresário em algumas de suas reflexões sobre suas origens, o amor pelos negócios, o papel da sorte, Minas Gerais, sucessão, filantropia, saúde. Ah, sim, claro, e o Atlético Mineiro.
O tino para os negócios
Sempre gostei de fazer negócios, desde menino. Já tive muitos. Até plantei feijão no quintal de casa e vendi. Mas tive dois negócios que me deram dinheiro quando eu era novo. Um era o bolão de linha, tipo uma loteria esportiva. Por exemplo, ia jogar Atlético e Cruzeiro, cada um comprava uma ou duas cotas e quem acertasse dividia o prêmio; eu ficava com 10% de comissão. Tinha uns 8, 9 anos. E dava dinheiro. Em preços de hoje, com uma aposta de R$ 5, se eu fizesse 50 apostas, ganhava R$ 25 por dia de jogo, talvez até um pouco mais.
Também era bom de engraxar sapato. Gostava de ganhar dinheiro. Tudo o que eu ganhava eu botava na poupança.
A aposta no “patinho feio” da construção civil
O mercado de habitação popular era pouco explorado, pouco valorizado e não despertava interesse das grandes construtoras. Mas justamente por isso me chamou a atenção. A MRV nasceu em 1979, em Belo Horizonte, com uma ideia muito simples e poderosa: fazer moradia econômica com escala, eficiência e disciplina – algo que quase ninguém ainda fazia no Brasil. Eu sempre acreditei que onde existe um grande problema existe também uma grande oportunidade. O déficit habitacional brasileiro sempre foi enorme. Enquanto muitos viam isso como um desafio que afastava investimentos, eu enxergava espaço para inovar, padronizar processos, industrializar e ganhar escala.
O que fez a empresa ter sucesso
A empresa cresceu porque apostamos em processo, tecnologia e padronização quando quase ninguém falava disso. Nada de reinventar a roda; era fazer a roda girar mais redonda. Com o tempo, ampliamos nossa plataforma de soluções habitacionais, mas sem perder o foco na moradia popular. E isso, para mim, nunca foi apenas um negócio. É desenvolvimento econômico e social. Quando você produz moradia acessível, você movimenta emprego, renda, impostos, mexe com o motor do país. Então, apostar nesse segmento sempre fez todo sentido. No fundo, a gente nunca apostou na dificuldade, a gente apostou no Brasil.
O impacto da MRV
Nossa estimativa é de que um em cada 120 brasileiros more hoje em um apartamento feito por nós. Em algumas cidades – Uberlândia, por exemplo –, um em cada 15 mora em um apartamento da MRV. É muita coisa.
O trabalho em família (com os primos no início, agora com os filhos e sobrinhos)
Quando dá certo, é ótimo. Me dá muita tranquilidade hoje. Os meninos começaram com 18 anos e hoje têm 40. Estudavam e trabalhavam. O Rafa é CEO da MRV desde 2013, já faz 12 anos. Não sou mais presidente de nenhuma empresa, só chairman. O fato de a sucessão já ter sido feita é bom para mim.
Como fazer a sucessão
Eu tive um pouco de sorte. Tudo na vida tem, não é? Mas também tem que ter vontade. Nos anos 1990, pegamos uma consultoria, a Fundação Dom Cabral, de Belo Horizonte, que começou a estruturar a gestão e a governança e profissionalizar a MRV, muito antes de a gente abrir o capital, em 2007.
O papel atual, de presidente do conselho
Quando você está no conselho, tem outra forma de gestão. Tem que ter as informações e, se possível, saber um pouco do dia a dia também, mas não tanto. Hoje tudo é digitalizado e mais fácil que antigamente, mas, se você deixar de acompanhar, não pode ser chairman. Outra coisa importante é como o conselho interage com a direção executiva da empresa. Nenhum conselho no mundo é igual, cada um tem seu DNA e seus métodos. Fomos desenvolvendo isso ao longo do tempo. Eu fui aprendendo a fazer. Hoje, trabalho em 12 conselhos. Então, é um desafio.
O desafio de delegar
A gente precisa acreditar nas pessoas, mas tem que ser gente boa, com G maiúsculo. Depois, precisa ter um negócio fundamental, que é a meritocracia. A empresa tem que ser fair dos dois lados: saber valorizar as pessoas e abrir os espaços. E depois que você cria um time e ele fica muito forte, coeso, algumas peças vão mudando, umas vão entrando, outras vão saindo, faz parte da vida. Mas, quando você consegue ter essa dinâmica, esse núcleo que funciona, é superbacana.
Construtora, banco, televisão, vinícola, time de futebol… qual é o preferido?
As três empresas de capital aberto são onde eu gasto mais tempo. Evidentemente, como fundador da MRV, tenho muito carinho. A vinícola é uma empresa nova, mais complexa, em outro país, eu gosto. Acabei de voltar de Portugal, é muito interessante estar lá, com outra cultura, vendo a vida acontecer, acho bacana. Para falar a verdade, eu gosto de tudo, não tem nada de que eu não goste. E futebol é uma paixão, uma coisa doida, dá um trabalho danado.
O motivo para entrar em um negócio
Eu gosto de resolver problemas reais. Gosto de construir coisa grande, com gente boa do lado. Negócio bom para mim é aquele que tem propósito, escala e futuro. Também é olhar o Brasil e pensar: é um país muito fértil, a gente tem muita coisa para fazer. Quando vejo um setor em que dá para gerar valor, emprego e impacto, como habitação, finanças, logística, mídia ou futebol, eu entro se acreditar que dá para fazer melhor do que está sendo feito. É isso que explica os resultados que temos hoje em todos os negócios, especialmente nas empresas de capital aberto.
O momento do Banco Inter
O Inter começou pequeno, em 1994, como uma financeira em Belo Horizonte. Fazíamos o básico: crédito consignado, crédito imobiliário, crédito para empresas. Em 2008, viramos banco múltiplo – ali a virada começou. Em 2015, demos o passo que mudou tudo: lançamos a primeira conta 100% digital e gratuita do Brasil. Ninguém fazia isso. Foi quando deixamos de ser Intermedium e viramos Inter. Depois, vieram outros movimentos importantes: fizemos o primeiro IPO de um banco digital na B3, fomos o primeiro banco da América Latina a operar 100% na nuvem, criamos um marketplace dentro do app e escalamos rápido. De milhares para milhões de clientes em pouquíssimo tempo. A internacionalização também passou a ser um capítulo central. Entramos nos Estados Unidos, adquirimos fintechs, levamos nossa base acionária para a Nasdaq e criamos a Global Account com a proposta de ser o “Uber das finanças”, com uma única conta e um único app funcionando em vários países, permitindo pagar, receber, investir e transacionar em dólar, e no futuro em outras moedas. Eu diria que estamos vivendo um momento de maturidade com velocidade. Na minha visão, ainda está muito longe do teto.
As dificuldades de gerir um time de futebol
O futebol tem dois problemas muito complexos. Um deles é que você mexe com paixão. São muitas cobranças e você precisa ter tranquilidade para tomar decisão. E o imponderável é um fator muito grande, maior do que nas empresas. O cara chutou uma bola, bateu na trave, você é campeão. Bateu, entrou, você não é. Isso envolve muita coisa.
As ações na SAF do atlético
Colocamos a casa em ordem. Profissionalizamos tudo, implantamos governança, renegociamos dívida, aumentamos a transparência e, principalmente, investimos pesado. Hoje o Galo tem um caminho claro. Ainda tem muito trabalho, mas é outro clube. A gestão é profissional, as contas fazem sentido, e a gente está construindo um Atlético sustentável. Dentro e fora de campo.
As lições de 50 anos de empreendedorismo
Tem uma coisa que a gente custa a aprender, mas quanto mais cedo a gente aprende, melhor. É o tal do “cisne negro”. Tem até um livro, A Lógica do Cisne Negro, do Nassim Nicholas Taleb. Às vezes, você está todo organizadinho e vem um fenômeno externo que te derruba. A pandemia foi um, mas já vivi vários ao longo da vida. As coisas que mais me atrapalharam ao longo de todos esses anos foram eventos externos, nunca os internos. São muito mais decisivos e você não está preparado para eles. Quem estava preparado para uma pandemia?
O Brasil favorece a escala
O Brasil é o troço mais interessante. É um país dicotômico, dificílimo de fazer negócios. Por outro lado, tudo o que a gente faz e todos os ativos que a gente tem são viáveis em países grandes. Para o negócio de casa popular, temos população e formação de famílias. É um negócio sem-fim. Imagina ter uma emissora de TV no Marrocos? Não adianta. O Inter foi o primeiro banco digital do Brasil e hoje tem mais de 40 milhões de correntistas. O Chile, por exemplo, tem 10 milhões de habitantes. É a vantagem de estar no Brasil: é mais complexo, muita burocracia, mas é bom para fazer negócios sob o aspecto de volume. E se você olhar quais são as cadeias que estão evoluindo no Brasil, são as que dependem de uma massa de 200 milhões de habitantes e 8 milhões e meio de quilômetros quadrados.
Reforma tributária, déficit, juros
A reforma tributária tem que acontecer, nós temos que modernizar. O que aflige é o controle fiscal. Precisamos trabalhar para valer no controle fiscal e no déficit público. Com esses juros tão altos, nada fica de pé. Nada. Esse juro real de 10% no Brasil é como envenenar a economia. Isso tem que acabar. E, para acabar, precisamos acertar esse déficit.
A convicção de ficar em Minas Gerais
O Brasil está muito concentrado em São Paulo, é um ímã. Das minhas empresas, só a CNN fica em São Paulo. Minas tem uma vantagem. Eu acho que você consegue atrair talentos mais facilmente. Nós exportamos mineiro, no bom sentido. Capacitamos gente de muita qualidade. É bom ter a sede das empresas em Minas. Cada cidade tem sua especificidade. São Paulo é bacana, mas está ficando cada vez mais distante do resto do Brasil. Nos Estados Unidos existem vários centros: Nova York, Chicago, Los Angeles. O Brasil não vai se desenvolver se a gente não tiver mais polos. Existe um desequilíbrio financeiro e cultural.
A importância de inovar
Inovação, para mim, é fazer melhor hoje do que você fazia ontem. Pode ser tecnologia, processo ou cultura. O que importa é melhorar. Na MRV, a gente sempre inovou porque era questão de sobrevivência: do decorado virtual às ferramentas de produtividade, sempre testando, ajustando e escalando. No Inter, a inovação virou modelo: simplificou o sistema bancário e mudou a relação do cliente com as finanças. No fim das contas, inovar é ter humildade para aprender, coragem para mudar e disciplina para executar. E não precisa complicar: inovação boa é a que funciona, resolve problema e cresce.
Como se manter atualizado
Tenho uma dificuldade enorme. Com 69 anos, meu maior problema é estar up to date, e não estou. A meninada tem muito mais facilidade, e eu tenho dois netos que me ajudam muito nisso. Meu neto Heitor, de 14 anos, mexe muito com isso, é todo conectado, então ele me dá aula de IA. Hoje, a inteligência artificial faz parte da nossa vida e tem que fazer parte das empresas. Eu não falo isso da boca para fora. Você precisa estar na estrada para não perder o caminho.
A saúde – física e mental
Nos últimos anos, comecei a olhar para isso com mais atenção. Faço caminhadas, cuido do corpo, da respiração. Tenho lido bastante sobre o assunto e um livro que realmente mudou minha visão foi Outlive, do Peter Attia. Ele mostra, de forma muito clara, que longevidade não é só viver mais, é viver melhor. É entender como pequenas escolhas diárias podem construir anos de vida com qualidade. Eu trabalho muito, faço muita coisa ao mesmo tempo, mas procuro ser disciplinado: exercício, boa alimentação, descanso e, principalmente, propósito. A gente não controla o tempo, mas controla como vive cada fase. Estar com a minha família, meus amigos e cercado de gente boa nos negócios, fazer projetos que têm sentido e manter a energia alta é o que sustenta minha saúde física e mental. No fim das contas, saúde é escolha.
A filantropia
Para mim, filantropia é parte do trabalho. Sou um dos fundadores do Movimento Bem Maior, que reúne grandes empreendedores para investir em soluções inovadoras e apoiar políticas públicas que tornem o desenvolvimento social mais justo e sustentável no Brasil. A ideia é usar filantropia estratégica: não só aliviar o problema, mas atacar as causas estruturais com projetos de educação, inclusão e equidade. O Instituto Galo segue a mesma lógica: usar a força do futebol e da marca Atlético para gerar impacto real em comunidades, com foco em oportunidades e desenvolvimento. Negócios e filantropia têm algo em comum: é tudo sobre responsabilidade com o futuro.
Reportagem original publicada na edição 136 da Forbes, lançada em novembro de 2025.
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Country Manager da Audible Brasil Mostra o Poder das Conexões na Carreira

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.
“A sorte me encontrou trabalhando.” A famosa frase atribuída a Pablo Picasso define bem a trajetória de Adriana Alcântara. Country manager da Audible Brasil, divisão de audiolivros da Amazon, ela construiu uma carreira que não só daria um livro como, de fato, virou um.
No início deste ano, a executiva com passagens por Apple, Globosat, Cartoon Network e Nickelodeon lançou “Conexões”, obra que também ganhou versão em audiolivro, narrada por ela mesma. O título faz jus a uma carreira marcada por encontros e relações que se transformaram em oportunidades e grandes amizades. “Quem tem boca vai a Roma. Sempre fui comunicativa, de fazer amizade e, quando você vê, essa amizade vira um emprego, um projeto”, diz.
Não por acaso, o primeiro capítulo do livro é dedicado à sorte – a mesma que guiou o primeiro capítulo de sua vida profissional. “Nunca é só sorte. Quando a oportunidade veio, eu agarrei e trabalhei para transformar em algo maior.” Com apenas alguns meses de vida, Adriana começou a atuar como modelo em comerciais, depois que sua mãe conheceu uma produtora durante um passeio com a filha ainda no carrinho de bebê, no Parque Ibirapuera.
Anos mais tarde, trabalhou como repórter e apresentadora do programa Walking Show, produzido pela Casablanca, daquela mesma produtora do parque, a empresária Arlette Siaretta, que morreu nesta semana.
Ao longo da carreira, Adriana passou por canais de TV por assinatura, trabalhou na gigante NBC, em Nova York, onde concluiu um mestrado na NYU, foi professora da pós-graduação da FAAP e participou da construção de startups. “Continuo bastante próxima das boas histórias”, resume.
À frente da Audible, lançada no Brasil há dois anos, e de uma equipe de cerca de 20 pessoas, viu o catálogo da plataforma crescer de 4 mil para mais de 7.800 títulos em português. “A Audible vem cumprindo um papel de desenvolver a economia criativa”, diz. Em 2025, liderou a produção de clássicos como “1984” e “Orgulho e Preconceito”, narrados por vozes como Lázaro Ramos, Alice Carvalho e Rodrigo Simas, além de projetos autorais. Mais recentemente, em parceria com a TIC Trens, levou audiolivros gratuitos aos passageiros de São Paulo, incluindo o seu “Conexões”.
A seguir, Adriana Alcântara revisita sua trajetória e compartilha os altos e baixos da carreira, os desafios enfrentados, as lições aprendidas, as conquistas que marcaram sua jornada e a forma como se reenergiza por meio da arte.
Forbes: Como chegou até a Audible?
Adriana Alcântara: Como é tudo conectado, foi a mesma consultoria que me chamou para participar de um processo para uma vaga no Twitter, em 2013. Em 2022, 9 anos depois, me mandaram uma mensagem pelo LinkedIn. Na época, tinha recém-saído do Cartoon Network, fui mandada embora numa reestruturação. Eles acham natural contar para você que é muito difícil conseguir outro emprego. Então, eles te dão um salário a mais e você fica arrasada achando que a vida acabou. Eu achava que eu não ia me recolocar. Meu plano era voltar a dar aula e prestar consultoria. O consultor me perguntou: “Você quer voltar para o mercado corporativo?” Eu falei que sim, mas que já estava com 47 anos. A própria Egon Zehnder me confirmou que depois dos 45 realmente fica um pouco mais difícil. Ele falou que tinha compartilhado vários currículos com o cliente e o meu estava entre os selecionados.
O que você acha que te destacou para assumir a posição?
Acho que tem dois pontos. O primeiro é por que o meu currículo foi selecionado pela Audible. Curiosamente, acho que a Apple teve um peso. O iTunes e a Audible são serviços digitais, com uma visão de produto e user experience e ambos eram lançamentos. É um segmento muito novo no Brasil. Não existia um executivo com anos de experiência dentro do universo de audiolivros. Isso fez com que o meu currículo fosse selecionado. E aí durante o processo de entrevistas, eu acho que estava madura para entender o que era pedido do outro lado. Apresentei um plano de expansão, um plano de negócio, por onde eu começaria. E certamente tive uma sinergia muito grande com a minha manager, que é quem tinha o maior poder de decisão. A gente tinha similaridades na forma de se comunicar, no background, ela também trabalhou na Viacom, da Nickelodeon, e também estudou na NYU. Acho que foi uma combinação de afinidade, preparo e maturidade.
Quais os primeiros resultados desses dois anos de Audible sob a sua liderança que já te dão orgulho?
Desde que a gente lançou a Audible até hoje – estamos falando de dois anos –, tanto o audiolivro enquanto produto quanto a Audible enquanto marca estão num outro lugar. Pelo tempo e pelas possibilidades que a gente já teve, tudo foi muito otimizado. Trabalhamos bastante próximo das editoras, que fazem lançamentos simultâneos, temos produções originais e de qualidade com talentos que são muito parceiros. A Audible também vem cumprindo um papel de desenvolver a economia criativa como um todo. Temos 700 vozes que entraram no estúdio para gravar audiolivros, e boa parte deles há dois anos nunca tinha feito isso. O audiolivro hoje é uma nova oportunidade de trabalho para estúdios de áudio, para produtoras de audiovisual como um todo, para atores, locutores, dubladores, radialistas. Eu vejo isso pulsando. A gente já recebe projetos de criadores que querem trabalhar com a gente. Isso mostra que a indústria criativa vê um movimento novo e interessante. E vejo também as pessoas consumindo o audiolivro como uma forma de complementar a leitura tradicional. Eu arrisco dizer que o catálogo que a gente oferece hoje já faz diferença na vida de muita gente que pega trânsito de uma forma mais produtiva e prazerosa, ou arruma a casa, cozinha.
Qual o seu objetivo à frente da empresa?
Uma vez que os brasileiros têm tantos desafios para conseguir acessar a literatura, gostaria de fazer com que experimentassem o audiolivro como uma possibilidade de crescer, de ter mais repertório e de avançar carreira de uma forma mais rápida. No Brasil, o audiolivro ainda é um formato novo que as pessoas estão descobrindo. Nosso objetivo é fazer com que essa descoberta seja acelerada e que o mais rápido possível os brasileiros tenham esses resultados.
Quais as diferenças entre o audiolivro e o podcast?
O diferencial do audiolivro é que ele é exatamente um livro que já foi escrito e que existe num outro formato. Ele não é uma história contada apenas no áudio. E com isso, ele traz aquela satisfação de que você está se educando e evoluindo. No começo do ano, as pessoas sempre fazem resoluções para ler tantos livros. Dificilmente alguém faz uma resolução para escutar tantos podcasts. A gente conta com o aprendizado e as oportunidades que os livros trazem.
Ao longo da sua trajetória, teve algum momento em que você pensou “cheguei lá”?
Quando fui selecionada para a Apple. Foi o primeiro lugar em que eu não fui por indicação de alguém. A Audible também foi assim. Foi através do LinkedIn que uma consultoria executiva entrou em contato para um recrutamento para uma vaga confidencial. Quem me contratou era gringo e nunca tinha ouvido falar de mim. E muita gente participou do processo.
No seu livro você fala sobre sua experiência na Apple, viajando e trabalhando muito logo depois de ter sua filha. Como foi esse momento?
Fiquei quase dois anos liderando o lançamento do iTunes à frente da parte de vídeo, com outros três executivos. Todos homens. O único com filhos tinha uma esposa que não trabalhava e era totalmente dedicada aos filhos, de 10 e 12 anos, e eu tinha uma bebê de um ano. Meu marido trabalhava tanto quanto eu no mundo de petróleo e gás. Minha mãe morava fora, então não tinha uma rede de apoio. Era uma loucura. Ficava baseada em Guarulhos (risos). Tinha vários endereços que eram muito mais reais do que a minha casa.
Como lidou com isso?
Na época, a gente (ou eu) tinha menos informação. Não existia burnout. Claramente eu estava ficando desequilibrada, fora do eixo. E ao invés de melhorar, as coisas iam piorando. Comecei a ter sintomas físicos, emagreci. Era tão intenso que eu nunca parava de trabalhar. Não me lembro de ter ido tomar um café com uma amiga ou até ter sentado com o meu marido para conversar porque simplesmente não tinha tempo. Em um mês, eram quatro viagens para lugares diferentes. Desde que eu tinha entrado na Apple, nunca tinha dormido mais de sete noites por mês no Brasil.
Ficava no fuso horário de cinco horas para frente, duas horas para trás, voltava para o Brasil. Ia para Espanha, México, Argentina e Colômbia, para a sede do iTunes internacional, em Londres, para offsites na Califórnia e em Miami. Mesmo que eu não tivesse minha filha, não sei se teria sobrevivido. Foram dois anos comendo mal, dormindo mal, em jet lag o tempo inteiro, sem fazer nenhum tipo de exercício e com uma bebê em casa, o que trazia uma frustração emocional de estar nessa vida.
Não é comum executivos falarem abertamente sobre burnout, demissão, erros, temas que você aborda no seu livro.
Todo mundo quer contar sobre os projetos legais; onde você errou a mão ninguém fala. Mas eu acho que é muito importante, porque o fato de ninguém falar faz com que você se sinta um lixo quando acontece com você. Parece que você é a única. Acho que é importante até para a evolução de quem vem ali na escada do corporativo, porque é muito traumático. Eu fui mandada embora da Nickelodeon por falta de inteligência emocional. Fui mandada embora da Apple talvez por falta de sensibilidade da gestão e por estar em um emprego incrível, mas num timing errado para o meu momento pessoal.
Falando de maternidade, como ela impactou sua vida e sua carreira?
Acho que é mais fácil falar como a maternidade não impactou a minha vida. Primeiro, a gente se torna mãe e automaticamente deixa de ser o centro da nossa própria vida. É como se a coluna vertebral passasse a estar num outro lugar e você passa a se preocupar com o outro de uma forma muito mais empática, e é um amor inexplicável. Claro, traz um milhão de desafios, principalmente para as mulheres. Eu vivi um momento de sair de licença-maternidade, quando voltei a empresa tinha se reestruturado, nem eu nem a empresa sabíamos mais qual era o meu lugar. É um caos muito especial e que traz um aprendizado que não tem preço, mas muda tudo.
Voltando para o início da sua carreira, você foi subindo muito rápido e muito jovem. Como foi isso?
Além de eu não aparentar a idade que eu tinha, comecei cedo, então fiquei um pouco à frente da minha cronologia. Enquanto todo mundo começava um MBA ou pensava em aplicar com 26, 27 anos, com 25 eu já tinha terminado e estava trabalhando na NBC.
Como lidou com o fato de aparentar ser mais nova?
Parecia visualmente mais frágil, tinha essa cara de mais nova. As pessoas deviam pensar: “Como vou dar um projeto desse tamanho na mão dela? Fala para ela fazer a ata”. Mas naquela altura já tinha mestrado, já tinha trabalhado três anos em Nova York, era a única estrangeira trabalhando numa das três maiores emissoras abertas dos Estados Unidos, e eu tinha 25 anos. Fui uma das mestrandas mais jovens da NYU no departamento de comunicação.
É até ridículo dizer isso, mas durante muito tempo eu jogava a minha idade cronológica. Eu falava: ”‘Olha, hoje já nos meus 30 anos, eu vejo as coisas dessa maneira”. Usei esse artifício durante muito tempo. Até com 40 anos eu ainda jogava isso em cima da mesa.
Por que decidiu ir para Nova York logo depois da faculdade?
Na época, era apresentadora de televisão. Achava que para conseguir me destacar, seria importante ter um inglês muito bom e fazer um curso, um aperfeiçoamento que pudesse contribuir para o meu currículo, formalmente falando. Eu queria muito estudar artes dramáticas e direção de atores. Meu pai falou: “Mas nem pensar”.
Sempre fui apaixonada pela velocidade da cidade. Olhei tudo que tinha lá e na NYU e tinha um programa que era uma combinação de um MBA, com uma estrutura de negócios, e um lado criativo com direção de atores na lista de eletivas. Era perfeito. Nem fui para a minha colação de grau porque já estava no mestrado.
E como conseguiu um emprego na NBC em Nova York?
Precisava arrumar um emprego e comecei a mexer meus pauzinhos. Tive várias ideias criativas para destacar meu currículo. Comprei 15 brinquedos que era tipo um cineminha, coloquei meu currículo e disparei. Não deu resultados concretos, mas enquanto isso, desci para passear com meu bulldog e encontrei uma mulher com um boné da NBC. Começamos a papear, eu falei que seria um sonho trabalhar lá e ela levou meu currículo e me ligaram.
Mais tarde, como foi o retorno ao Brasil?
Quando eu voltei, achei que com esse currículo ia poder escolher onde trabalhar, mas não foi bem assim. Procurei um colega de escola que trabalhava no SBT. Era 2001, o momento econômico não era bom no Brasil. E aí ele falou que se fosse eu, tiraria o mestrado do currículo, ainda mais para tentar um emprego na TV aberta. “O chefe do meu chefe não tem um negócio desse”.
Ele mandou o meu currículo para a Elisabetta Zenatti, que era head e sócia da produtora RGB, que trouxe o CQC e programas como o Pop Stars e o Zapping Zone. Ela queria entender por que eu tinha trabalhado na NBC e eu precisei contar que foi pelo mestrado. Eu perguntei: “Você teria me chamado se soubesse”? Ela falou que não, mas me deu uma super oportunidade. Eu reportava para ela, aprendi pra caramba e foi bacana ver uma mulher liderando aquele tamanho de operação no SBT, e ela era muito jovem. Era uma idade meio próxima e isso também me incentivou muito. O Pop Stars foi um reality que tinha 17 mil meninas no Sambódromo na primeira eliminatória. Antes de acabar, eu fui recomendada para a Nickelodeon e aí eu entrei para o mundo corporativo. Fiquei 5 anos.
E de lá você foi para o Rio?
De lá eu fui para a Globosat fazer aquisição de conteúdo internacional. A empresa ficava na Avenida Brasil. Eu falei: “Imagina, vou a pé para o trabalho, o sonho de qualquer paulistano”. Aí fui parar no Rio de Janeiro.
Os canais da Globosat tinham pouca coisa feita no Brasil, era tudo comprado fora e dublado. Por exemplo, GNT tinha dois ou três programas brasileiros. O resto era Super Nanny de Londres, Super Nanny dos Estados Unidos, o Gordon Ramsay, Jamie Oliver – eu comprava esses programas. Foi uma oportunidade totalmente diferente do que eu conhecia.
Por que decidiu ir para o Rio?
Primeiro, eu disse: “não”. Aí depois de dois dias, eu me arrependi. Ainda estava traumatizada com a minha chegada no Brasil e a dificuldade de me colocar. Tudo era mais difícil sem o LinkedIn, sem conseguir se colocar numa vitrine, entrar em contato com as pessoas, não tinha essa dinâmica. A gente não ficava sabendo de vagas. Eu tinha muita energia para não colocar em lugar nenhum. E tinha a cobrança de ter o financeiro para poder me bancar e uma evolução de carreira.
Brilhou o meu olho o fato de ser uma coisa totalmente diferente. Eu era solteira, viajava o mundo inteiro, tinha umas sete viagens internacionais por ano.
Depois da Apple você foi criar o Food Network. Como foi essa transição?
Era sair da empresa e do cargo que todos os executivos almejavam. Naquela época, recebi um e-mail do LinkedIn dizendo que meu perfil estava entre os 1% de executivos mais visualizados da América Latina. Depois de trabalhar em grupos com vários canais, eu fui para um canal, o Food Network, em um momento em que a Netflix já estava no Brasil, então a TV por assinatura não era o último biscoito do pacote. Era o biscoito que estragou. Mas acabou sendo um projeto incrível.
A gente fez um lançamento totalmente ao contrário do que todo mundo fazia. Lançamos na internet, o que era um tabu gigantesco. Conheci pessoas maravilhosas, aprendi a cozinhar, porque até então não fritava um ovo – hoje faço até paella. A equipe era uma delícia e todo mundo trabalhava muito e feliz. Como o canal ainda não estava no ar, a gente não tinha pressão de números. Estávamos montando a parte legal do negócio. Não podia ser mais perfeito. Fiquei cinco anos. De lá eu fui para o Cartoon e depois para a Audible.
Ao longo da sua carreira, como enxerga a evolução da liderança feminina?
Subimos muitos degraus, mas ao mesmo tempo ainda temos um longo caminho pela frente. Hoje, a gente sabe e pesquisas mostram que o percentual de mulheres em conselhos está em torno de 13%, o que é muito pouco. As mulheres ocupam posições de destaque e de liderança em várias empresas, mas poderiam ser mais numerosas. A líder mulher não é nem melhor nem pior do que um líder homem, mas eu acho que a gente traz para mesa diferenciais que são muito importantes: uma leitura do ambiente mais clara, mais sensível, melhor comunicação, principalmente no feedback, que é um momento delicado.
A trajetória de Adriana Alcântara, country manager da Audible no Brasil
Primeiro cargo de liderança
Foi em 2001, como gerente de produção da Nickelodeon. Na época, a TV por assinatura estava começando no Brasil e eu voltei de Nova York de um cargo como contribuidora individual para liderar uma equipe. Ali eu tinha uma combinação do mundo corporativo e, ao mesmo tempo, uma gestão muito grande de produtoras externas que prestavam serviços. Era como se fosse uma uma equipe indireta que trabalhava diretamente sob a minha supervisão.
Quem me ajudou
Eu acho que eu não seria ninguém sem muitas pessoas. Nem posso citar nomes porque certamente deixaria alguém de fora. Mas eu acho que sempre tive o privilégio de ter gestores com quem eu pude aprender e que sempre confiaram no meu potencial, cada um à sua maneira. Não que a vida tenha sido sempre tranquila, fácil e perfeita, mas eu acho que até nos desafios eu aprendi muito. Mas mais do que isso, eu acho que sou quem eu sou pelas equipes que eu tive a sorte ou o talento de montar, e a forma como a gente conseguiu trabalhar em cada uma dessas empresas.
Turning point
O principal foi quando eu mudei para o outro lado da mesa. Eu vinha de uma carreira sólida e muitos anos trabalhando em canais de televisão e tive a oportunidade de trabalhar do lado do operador. Na Oi, eu também tive o desafio de trabalhar numa empresa onde as mulheres eram minoria. Uma telecom, com muitos homens, engenheiros, em sua maioria. Foi um desafio muito grande porque vinha de um DNA muito criativo, não era muito direta, concisa e baseada em dados e ali tive que aprender muito rapidamente como me comunicar para não perder o interlocutor quando estava defendendo um ponto de vista.
O que ainda quero fazer
Eu acho que eu quero fazer quase tudo que eu não fiz, mas não é possível. Se tivesse que escolher, ainda tenho vontade de fazer teatro, porque também sou atriz de formação e é uma paixão muito grande. Também nunca trabalhei com cinema, nem em produção nem como atriz e roteirista, então também está na minha lista. Eu queria escrever um livro, mas realizei esse sonho no começo desse ano. Outra coisa que eu queria muito fazer é me dedicar mais a uma ONG que eu lidero aqui no Brasil, a Protect us Kids, que foca em segurança cibernética para jovens e crianças. E com a minha formação e as conexões que eu tenho, conseguir disseminar esses riscos de uma forma consistente, um pouco mais forte do que eu consigo fazer hoje. Gostaria de deixar como marca um mundo mais seguro no ambiente digital.
Causas que abraço
Primeiro, tudo que é relacionado a crianças. A infância é um momento muito mágico e ao mesmo tempo determinante do adulto que aquela pessoa vai virar. Segurança, acesso à educação, acesso à alimentação, a oportunidades, são coisas que mexem muito comigo.
Acabei trabalhando no Disney Channel, na Nickelodeon, no Cartoon Network, com a Protect us Kids, e isso se duplicou com a maternidade. Com uma filha mulher, que também acaba sendo um pouco mais sensível, essa é uma causa que me toca bastante.
Um livro ou audiolivro que inspira minha visão de gestão
Eu gosto muito de autores. Gosto do Adam Grant e das visões dele de mundo, de processos, de relacionamento. Sou uma pessoa mais do livro de autodesenvolvimento do que de ficção, mas graças ao audiolivro eu abri um espaço para a ficção. Agora eu estou finalmente me dedicando a escutar Colleen Hoover, e estou amando.
Um hábito essencial na rotina
Ter um momento para mim, normalmente relacionado às artes. O meu balé é muito essencial para me manter equilibrada e feliz. O próprio audiolivro é um momento em que eu me sinto produtiva e relaxada. Existem pessoas que se equilibram quando meditam, quando vão para um lugar sem internet ou trânsito. Eu funciono um pouco diferente. Para mim, relaxar é quase limpar a cabeça e abrir espaço para ver e aprender coisas novas. Acho que eu sou das poucas pessoas que vai para Nova York para relaxar. Não tem caos maior, mas estar sem horário, entrar no museu, olhar as pessoas e ter muitas referências pulsando, realmente sinto que eu volto descansada.
Um conselho que daria para mim mesma no início da carreira
Não se preocupe com o que os outros vão achar. Tente. Eu acho que eu consegui fazer metade disso. Consegui aproveitar na medida do possível as oportunidades que apareceram e agarrei sempre que eu pude com unhas e dentes, mas lembro que com 20 e poucos anos eu era muito autocrítica. Um pouco aquela coisa da crise da impostora.
Com 20 e poucos anos você não tem que entregar nada perfeito. Você está começando a carreira. Abaixa um pouco a exigência e foca em agarrar as oportunidades. Se com 51 anos eu estou longe de saber tudo e com 100 também estarei nesse lugar, porque alguém com 20 e poucos tem que se cobrar tanto? Talvez essa cobrança tenha minado a minha energia que poderia ter ido em outros lugares e me ajudado a crescer um pouco mais rápido.
Uma dica para mulheres que almejam posições de liderança
As mulheres podem tudo. Hoje é muito claro que a gente consegue ser ótimas executivas, ótimas gestoras. É inegável. Quanto mais a gente sobe, é importante que a gente valorize as mulheres dentro das organizações, que a gente não queira ocupar esse lugar sozinhas. Eu não acho que ser a única é um motivo de orgulho. Motivo de orgulho é ver que várias outras mulheres que trabalharam comigo hoje são diretoras, gerentes, estão evoluindo e numa jornada parecida.
A coluna Minha Jornada conta histórias de mulheres que trilharam vidas e carreiras de sucesso.
O post Country Manager da Audible Brasil Mostra o Poder das Conexões na Carreira apareceu primeiro em Forbes Brasil.
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